Olhos do Hórus

Somos tantos e tão poucos...anjos, quase todos loucos pela vida e pelo pão. Somos santos desalmados, mortos-vivos, mal-amados...deuses sem religião. Mas, pra quem quer achar saída, temos os trilhos da vida...pra quem quer seguir adiante, temos o melhor caminho... Somos todos peregrinos, passageiros clandestinos das vãs asas do destino...

Friday, November 03, 2006

Um pouco do mesmo, ou colcha de retalhos

Bem...é noite, 03 de novembro...estou aqui pensando se resisto à tentação de escrever um pouco sobre as últimas horas de interação com as coisas do Falco...observar, fotografar, tomar nota das atividades e comportamento, coletar material.
Sei que deve ser chato ler sobre algo que não deve soar tão interessante senão pra quem gosta do assunto. Mas acho que vou tentar não ser muito chato..
A verdade é que se o Blog virar só um arquivo de poesias e textos redondos e fechados, isso vai dar um formato que aos poucos pode morrer em si mesmo...mesmo porque não tenho tantos textos escritos...em alguns meses postando todo dia, eu iria (ou melhor, o Blog iria...) à falência, especialmente porque não tenho produzido muita coisa ultimamente.
Então talvez seja bom dar uma cara de BLOG pra isso aqui...umas narrativas ali, umas fotinhas acolá...Sim, quero muito que esse blog possa ser sempre que possível bem ilustrado. Só não posso deixar virar bagunça esse troço! Senão nem eu mesmo vou dar mais bola pra isso aqui...que dirá os meus MILHARES(rsrs...acho que dá pra contar na mão tetradactila de Lula o número total de visitantes desse blog...) de visitantes!!

Ontem foi o dia que eu havia pedido anteontem, quando o tempo me deu umas rasteiras...me trazendo umas chuvas-surpresas na hora que bem estou me entendendo com o Falco pousado na Catedral, com a câmera fotográfica e com o tripé...ah, e com meus joelhos ralando de tanto buscar uma posição abaixo de um metro para enxergar nitidamente a telinha da câmera enquanto busco o inalcançável foco perfeito.

Mas, pois bem...ontem foi só Sol...até demais! Às 05:15h da matina lá estava eu no meu posto, diante da Catedral de São Sebastião, medindo a posição do Sol, escrevendo algumas informações importantes sobre o Falco pousado numa das suas colunas cativas da Catedral, procurando o ponto ideal para armar o tripé e puxar o gatilho...
Pra quem se reconhece tímido como eu, escolher um feriado para ficar horas no meio de uma praça fotografando e anotando "coisas" que ninguém mais vê e sequer imagina que pode ser é uma boa alternativa de se sentir dono da situação...afinal, praça é praça...um mundo de gente de tudo que é jeito, forma, cor e estágio de loucura(ou excesso de lucidez)cruza os mesmos pedaços de chão. Mas num feriado de finados, ao menos as coisas ficam mais calmas. Mas ainda assim não escapei - debaixo da minha bermuda, do meu velho boné padrão "observador de Falco peregrinus metido a besta" retirado do guarda-roupa e com cheiro de coisa velha(né, MILLAAA?), por trás do tripé e da câmera - de ser tachado por uns e outros como gringo deslumbrado fotografando a bela catedral ilheense! Fazer o que? Devia estar mesmo fantasiado de gringo, incluindo o bandeiroso tripé à tiracolo na minha frente.

Ah, sim! Pra quem não conhece ainda, eis abaixo a bela Catedral de São Sebastião, a qual foi "religiosamente" adotada como um ponto de pouso e caça diário pelo viajante rapinante setentrional.





Fiz essa foto no fim da tarde de ontem, da varanda da casa de Milla, com o Sol morrendo e derramando seu derradeiro brilho laranja-dourado sobre as paredes da Catedral...

Mas então, voltando um pouco no tempo...é engraçado como a consciência trai...e atrai. Eu sabia que embora fosse um tanto necessário e junto a isso, prazeroso, não dava pra ficar plantando sob o Sol da praça de um feriado de finados com um tripé, um caderno de notas, um joelho um tanto dolorido e um falcão fazendo poses na sua quase inércia de descanso matinal. Em casa havia um Excel já aberto na tela do computador e uns certos artigos me esperando voltar! Ok, a consciência é quem manda! Afinal o tempo ruge na savana onde a zebra é manca...

Volto pra casa...volto pra catedral horas mais tarde...pra dar um desfecho mais redondo nas observações e tentar fazer mais umas imagens com sol dourado de fim de dia.
Depois um pulo em Milla...e então, como não podia deixar de ser...o sagrado sorvete na orla, um filme no DVD(putz, esqueci o nome!), muita risada sobre histórias com sustos(rsrsrsrs!!!)e de volta pra casa...

Hoje, dia 03/11, acabei não fazendo fotos, mas na minha visita de rotina para checar os pontos do Falco na Catedral e buscar restos de caça, ganhei um brinde! Afinal é sempre bom quando aparecem novidades na listinha básica de presas do Falco...
Tudo que achei foi um belo par de asas, cinzas, com 30cm cada uma. Mas dessa vez era um par de asas inéditas...coisa nova no pedaço. Quando no lugar do par de asas vem uma cabeça(sim, os peregrinos quando comem suas caças, desarticulam e descartam a cabeça, as pernas e as asas...o que vira um brinde para ajudar a identificar tudo que ele come) até que isso vira uma espécie de atalho...identificar a espécie predada vira uma coisa relativamente simples. Mas quando tudo que se acha é um par de asas de uma espécie que ainda não havia sido coletada antes, a coisa fica muito mais interessante de se interagir. Principalmente quando é um par de asas relativamente grandes e longas, o que ajuda a descartar certas suspeitas e alimentar outras!
Pois bem...ensaquei, etiquetei, datei, marquei hora de coleta...um pulo na casa de Milla...e de volta pra casa. Pois bem...lá vou eu confirmar uma das minhas três suspeitas de espécies que poderiam ser donas do bendito par de asas descartado pelo peregrino. Qual o que! O livro que eu pensava ter todas as aves do Brasil e que poderia me tirar essa dúvida para analisar padrão de cor e forma não tinha todas as espécies que eu precisava.
Pois bem...é hora de usar a cabeça...tenho um par de asas...e é só o que tenho.
Analisei cada padrão de penas, coloração e o principal...a forma das asas...não eram asas comuns...eram muito longas...e o tom de cinza não me remetia a qualquer espécie que vinha na cabeça com aquele padrão de forma de asas...eu tinha uma peça do quebra-cabeça...tinha que achar o espaço certo para encaixar sem margem de erros.
Asas longas como aquelas me levariam a dois caminhos e algumas famílias de aves...os dois caminhos eram comportamentais...a ave possuía vôo rápido e necessariamente acrobático...e o outro caminho...haveria chances de ser uma veloz predadora...isso me faria excluir algumas famílias e especificamente algumas espécies.
Mas aquele tom de cinza ainda deixava uma lacuna nas minhas suspeitas...
Penso mais um pouco, entre todas as mais de 1800 espécies de aves que existem no nosso supermegadiverso Brasil...e...bingo! Me vem à mente a ave que parecia fugir da lembrança...uma andorinha-do-mar! O falcão teria abatido e consumido sob o sol de ontem uma ágil andorinha-do-mar. Abro as asas, analiso a inserção da asa onde deveria ser o corpo e a disposição das penas...as coisas se encaixavam. Mas seria impossível chegar a qualquer conclusão sólida sem antes procurar fotos de todas as espécies de andorinhas-do-mar(ou trinta-réis) que rondam pela costa brasileira e especificamente nordestina e então analisar com mais precisão o padrão de coloração de cada uma e a forma, tonalidade e disposição dos três diferentes tipos de penas que formam as asas.
Eis que realmente a peça estava encaixada...foi sim uma andorinha-do-mar que nas últimas 48 horas teve seu momento de azar e de caçadora(ou pescadora nesse caso), virou a caça...do infalível peregrino.
Agora restar confirmar entre três espécies muito próximas, das quais uma na verdade é, como o peregrino, uma visitante regular das bandas de cá, nativa das terras norte-americanas...para chegar ao X definitivo da questão, preciso só de mais uma ajuda...e essa vai ter que vir de cima! De Deus? Não, não!! Dos ventos...afinal resta a eles - como geralmente tem acontecido - soprar um pouco mais forte e levar abaixo a cabeça(com resto do corpo semi-devorado, quem sabe?) do almoço do nosso amigo peregrino. Até mais!

1 Comments:

Blogger Poemas de Sótão e Porão II said...

Texto lindíssimo! Amei demais.
Acho que o seu livro começa a ser traçado pela vida, com tintas das águas do mar. Cheio de encantos e encantamentos. Areias, pedras, conchas, gravetos, pedaços do além mar.
Onde se ouve ao longe, e basta ter ouvidos de fadas, os gritos longíncuos do Falco anunciando a chagada em terras latinas.
O nosso Falco de asas urbanas, bem sobre a caixa de ar condicionado, a comer pombos.
Ah saudade monstro cruel com cara de deus e de diabo. Saudade que mata um pouquinho a cada dia, como fera voraz ávida pelo reencontro.
E o Falco desaparecido, o das procupações e dos lamentos do amigo orkutiano, chegou?
Comecei a sentir a falta Dele também, e a clamar aos tempos por boas notícias.
Como você acabou de pousar na rede, vou agora ao seu encontro. Voltarei depois com flores para decorar os seus caminhos.
Até breve, pois.
Beijos de amor de pteropas-mãe.

6:06 AM  

Post a Comment

<< Home