Olhos do Hórus

Somos tantos e tão poucos...anjos, quase todos loucos pela vida e pelo pão. Somos santos desalmados, mortos-vivos, mal-amados...deuses sem religião. Mas, pra quem quer achar saída, temos os trilhos da vida...pra quem quer seguir adiante, temos o melhor caminho... Somos todos peregrinos, passageiros clandestinos das vãs asas do destino...

Tuesday, December 19, 2006

Foto by: Vanessa Lins

Motivo
Cecília Meireles

Eu canto porque o instante existe
e a minha vida está completa.
Não sou alegre nem sou triste:
sou poeta.

Irmão das coisas fugidias,
não sinto gozo nem tormento.
Atravesso noites e dias
no vento.

Se desmorono ou se edifico,
se permaneço ou me desfaço,
- não sei, não sei. Não sei se fico
ou passo.

Sei que canto. E a canção é tudo.
Tem sangue eterno e asa ritmada.
E um dia sei que estarei mudo:
- mais nada.

Monday, December 18, 2006

Mais do mesmo (Parte II de 2)

Olá! Ontem eu estava pensando...uma das coisas mais prazerosas e gratificantes que se tem no cotidiano do círculo social é se perceber ser digno da confiança de outras pessoas. Falo isso por causa de algumas coisas que às vezes acontecem...desde situações mais fechadas, de cumplicidade, confidencialismo (se não existia esse vocábulo, passa a existir agora...pois ao que sei, "confidência" é a informação secreta em si, e não o ato, a atividade...) até situações menos intrínsecas ao relacionamento direto entre as pessoas.
Ontem foi por uma questão especial, mas que já se repetiu em outras situações, quando dos meus estudos com o Falco peregrinus no meio urbano. Para fazer as observações, e principalmente somar as observações aos registros fotográficos, muitas vezes eu preciso estar em alguns pontos não muito usuais, mas que são os únicos que permitem alguns privilégios.
Em Salvador eram os terraços, casas de máquina e caixas d'água dos prédios mais altos de um dos bairros mais densamente "prediados" da cidade, assim como cobertura de hotel, varanda de academia de ginástica...e por aí vai!
Em Conquista o Falco que lá acompanho (ou, agora, acompanhava, infelizmente), só tem 3 pontos de atuação e apenas uma base para cada um...então era mais fácil. E lá alguns dos pontos que eu visitava eram justamente os apartamentos do prédio mais alto da cidade, utilizado religiosamente pelo Falco. Em especial eu visitava não para observar, mas para fazer fotos panorâmicas da área de caça e principalmente coletar restos de caça, que ficavam acumuladas aos montes nos canteiros pouco visitados pelo moradores, onde o Falco costumava ficar.
Mas então...num tempo onde a gente anda morrendo de medo da própria sombra e desconfia do som dos próprios passos, poder ter acesso a alguns desses pontos é se fazer merecer muita confiança por parte de algumas pessoas...
Não é muito fácil imaginar que uma pessoa, seja quem for, consiga por meio de um diálogo simples e por vezes pouco convincente (convencer de que gostaria de subir ou ter acesso a X local para observar um falcão que vem de longe e fazer enxergar relevância nisso, nem sempre é muito fácil), ter acesso a propriedades privadas, cheias de controles de segurança, regimentos, etc.
Ontem por exemplo, foi legal...estava eu observando e fotografando o Falco de dentro da torre da catedral...mas era domingo, e a catedral só permanecia aberta enquanto a missa matinal estivesse rolando.
Tudo bem...lá fui eu pra torre, atento ao som do padre cantando ao microfone e dos fiéis respondendo em uníssono. Afinal, o fim da missa era o sinal de que era hora de eu descer, caso contrário ficaria preso pelos dois portões de ferro e um portão de madeira, que separam a torre da ala principal da Catedral. Por garantia deixei um aviso de que eu estaria lá em cima...
Consegui observar e fotografar o falcão por 4 horas e meia...benditas baterias recarregáveis..dessa vez foram mais eficientes do que eu poderia prever...
Eis que a missa acabou...enquanto ainda ouvia as vozes das pessoas conversando no entorno da catedral, permaneci um pouco no alto da torre, fotografando. Até que veio a mim um funcionário do recinto "catedrástico" avisar-me de que a catedral já seria fechada naquele momento...avisei que iria subir pra arrumar as coisas e descer novamente...
Levei ainda uns três minutos fazendo umas últimas fotos, pois o Sol antes intimidado pelas nuvens aos poucos parecia se animar em entrar em cena, vazando a cortina prateada no céu.
Quando desci tomei um susto...tudo escuro no decorrer da escadaria abaixo...pensei: "putz, fecharam o portão de madeira!!'
Bateu logo a sensação seca de certeza de estar preso ali...antes mesmo de chegar no portão...e junto com a certeza a lembrança de que no bolso tinha um celular sem crédito...e que teimava em não fazer ligações a cobrar...eu tava ferrado!
Quando enfim cheguei no portão...o diacho realmente estava fechado...mas...apenas fechado...sem passar a chave...e bastou um pouco de jeito para abrir, já que a maçaneta pesada na madeira densa era um pouco dura, o que de início me fez achar que estaria mesmo trancada!
Ao sair da catedral, encontro, já indo pro seu carro, o chefe/diretor da mesma, que muito simpaticamente me pergunta: "Oi, tudo bem, e aí, tá observando seu falcão, é? O bicho não sai daí, né?"
Eu confirmei, acrescentando que dessa vez consegui fazer umas fotos melhores, já que enquanto tava tendo a missa, eu consegui observá-lo da torre, enquanto a catedral não fechava. Qual não foi minha surpresa, quando o padre/chefe, então me perguntou se eu não queria ficar observando o falcão mais tempo... Eu, sem entender, perguntei: "ué, mas não já fechou a catedral??"
Ele então disse que sim, que ele já tava tbm de saída, mas que eu podia ficar lá o tempo que quisesse, que bastava depois eu bater os portões e trancar o que era de ser trancado... Achei isso legal...é confiar demais numa pessoa que nem conhece direito senão de umas poucas esbarradas enquanto ele chega na catedral pela manhã cedo e me encontra do lado de fora, já de caderno e câmera em mãos acompanhando o rapinante viajeiro...
Digo isso porque a catedral não é uma igrejinha à-toa...é uma puta catedral, linda por dentro, cheio de coisas...é o cartão postal mais conhecido da cidade, depois de algum outro cartão que eu não sei qual é, mas deve ter sim...
Pois sim...agradeci bastante ao padre a gentileza e confirmei que teria o cuidado de fechar tudo...e então voltei escadaria acima para o meu point de observação. Permaneci lá por mais algumas horas...
Estou começando a usar uns esquemas para fazer o falcão não se intimidar muito com essa minha presença mais próxima (peregrinos são extremamente desconfiados e cautelosos...um movimento próximo e eles batem asas...eu que o diga, nas minhas inúmeras tentativas de fotografá-los a distâncias que variaram entre 1m (óbvio que sem o bicho me ver) e algo menor que 10m. Já que o invasor sou eu e o objetivo a fazê-lo continuar adotando os seus pontos de pouso, mesmo sabendo da minha presença, passo então a não evitar minha aparição...e pelo contrário, fazê-lo me perceber e então se acostumar com minha inofensiva presença nas proximidades do seu ponto de pouso...tanto que ontem fui de camisa vinho, me evidenciei bastante e até arrisquei sair um pouco da torre, para até onde meu medo de altura permitisse...rs! Essa é uma maneira de fazê-lo apressar a confiança na minha aparição, para futuras visitas mais próximas...

Na saída, ao atravessar o salão principal da catedral para sair de vez para a rua, observei que é realmente bonito lá dentro...fiz até umas fotos, apenas pela beleza artística e arquitetônica, já que o âmbito meramente religioso da coisa não me atrai tanto...
Confesso que meus dedos coçaram ao avistar um teclado enorme que estava lá, plugado num amplificador...deu uma vontadezinha doida de ligar o bicho e me deleitar...rsrs!! Mas eu jamais faria isso...jamais...hum... acho que se no lugar do teclado tivesse era um bendito piano de cauda, esse "jamais" teria perdido sua função ética na minha consciência naquele instante!
Abreijos a todos e seguem algumas fotos....primeiro do Falco peregrinus...depois, do interior da catedral...
Té logo!

obs: clique nas imagens para vê-las ampliadas.




































"Vamos ouvir calados a sinfonia dos ventos nos vitrais. Numa catedral, numa fábrica, num apartamento escuro, no meio dos arranha-céus"

Sunday, December 10, 2006

Mais uma...

Onde Deus possa me ouvir (Vander Lee)

Saturday, December 09, 2006

Um vídeo que deixei lá no YouTube...vou colocar mais vídeos lá, mas apenas este vai ficar upado aqui, senão perde a graça de entrar lá pra assistir na fonte!

Palavras e Silêncio (Zeca Baleiro)

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Thursday, December 07, 2006

Fotoperegrinando...

Ontem consegui fazer umas fotos mais legais do peregrino...dessa vez tiradas por dentro de uma das torres da catedral onde ele fica, ficando assim um pouco mais próximo ao rapinante viajeiro...
Como as fotos foram tiradas no horário em que ele já se alimentou e permanece um longo período em repouso no seu ponto de sombra, ao mesmo tempo que tive a tranquilidade de saber que ele não voaria logo deste ponto (mas é bom não confiar nessas previsões imprevisíveis de estados instáveis...), senti um pouco a falta da luz incidindo um pouco mais diretamente sobre ele, para aproveitar melhor o privilégio de estar mais perto e obter um pouco mais de detalhes e nitidez na plumagem e cabeça do bicho...
Mas foi legal poder tirar as fotos de uma altura mais nivelada com a do Falco e vê-lo um pouco mais de perto, já que, fotograficamente falando, meus maiores desafios com os peregrinos costumam ser alcançar a mesma altura que eles tanto insistem em ficar e com isso diluir um pouco a distância tão constante que acabo tendo nas observações de solo.
Mas, chega de blá, blá, blá...vamos às fotos...um pouco melhores que as anteriores deste ano. E não tem jeito...a beleza e elegância do bicho sempre ajudam, tanto quanto sempre pedem aos meus exigentes (pra não dizer teimosos!) intuitos um pouco mais de qualidade...rsrs!

Obs: clique na foto para vê-la ampliada.








O observador...


...sendo...


...observado








O falcão em atividade de "grooming"- processo de limpeza, arrumação e lubrificação/impermeabilização das penas. Esse comportamento sempre ocorre nesse intervalo mais longo de repouso, podendo durar até 90 minutos, especialmente durante a tarde, quando se estende até poucos minutos antes do horário de atividades de caça.

Saturday, December 02, 2006

Entre o céu e a água

Somos todos mitos...nascemos e morremos todos os dias...viramos mito a cada ressurreição...e como nem sempre dá pra evitar renascer sempre igual, melhor fazer o dia nascer diferente...diferente como duas horas no silêncio que entremeia o mangue, a água e o centro da cidade...em pleno centro da cidade. Diferente como conseguir não ouvir vozes humanas nem som de carro...diferente como fazer algo absolutamente normal e se fazer disso algo diferente...apenas pra não ser mais um dia dentre tanto outros...

E assim começo o dia...dentro de um caiaque...
A propósito, nada de anormal nisso...mas é que, como dito acima...o que vale é enxergar-se nisso algo a mais que apenas isso...palavras repetidas, mas dias inéditos.

Comecei o dia dentro de um caiaque por dois motivos: 1 - faz tempo que me bateu essa vontade de dar essa remada nas águas calmas que separam o centro de Ilhéus do Pontal...passar por baixo da ponte e ir um pouco mais além pra ver onde vai dar...
2- Recentemente obtive um dado que me fez criar a necessidade de observar e buscar alguns pontos de mangue nesta faixa da cidade...o falcão peregrino que acompanho aqui capturou uma ave cujo exemplar abatido acabou por virar o primeiro registro dessa espécie na Bahia... Isso pode dar algum pano pra manga...
Tal espécie, que não posso citar por algumas razões éticas e óbvias, é habitante do ecossistema halófito e hidrófilo típico de manguezal e me senti um pouco com o compromisso de tentar localizar em quais pontos supostamente visitados pelo falcão como área de caça e abordagem a aves aquáticas haveria uma vegetação de mangue que poderia estar dando refúgio a esta espécie de ave, que por sinal, é considerada rara...razões suficientes para escolher um início de dia de céu claro como hoje e me descambar margem afora pelas águas que levam aos mangues urbanos de Ilhéus.

Em duas horas de remada e algumas paradas para observação e algumas fotos pude perceber que em algum ponto, ainda que não tão distante assim, se pode chegar a um espaço em que, ao menos antes das 7:30h da manhã, pode se dar a estreita liberdade de não mais ouvir o som urbano dos carros e das vozes humanas, mas apenas um silêncio quebrado pela algazarra dos quero-queros, das garças, dos bem-te-vis e de martins-pescadores com suas vocalizações estridentes.
Pois bem...enquanto observava o padrão da paisagem,especialmente do mangue margeando o espelho d'água, e dava umas remadas, aproveitei pra clicar um pouco e congelar uns instantes desse "passeio"...


Bom, essa foto foi feita outro dia...mas mostra parte da visão geral da enseada do Pontal...para além daquela ponte(a famosa ponte do Pontal), no segundo plano, ficam os mangues...para onde remei...



Uma das paisagens opostas ao Pontal...o Morro do Pernambuco, que divide o mar agitado das águas calmas da enseada...fotografado a caminho da saída para o mangue...Sol se erguendo ainda...



Dando a volta pra ver o que tem no "lado de lá"...



A ponte não é de concreto, não é de ferro, não é de cimento...a ponte é até onde vai o meu pensamento. A ponte não é para ir nem pra voltar...a ponte é somente atravessar
...caminhar sobre as águas desse momento...(Lenine)


Mangue...raízes tentando levantar vôo...



Na contra-luz e a favor das águas...


Espelhos d'água...o céu de ponta-cabeça...




"Onde estão seus olhos...agora que achei o foco...?"



Margem do mangue e algumas garças, socós e batuíras.


Depois do vôo assustado, um remanescente observa vigilante o observador...


Alguns quero-queros alternando entre um repouso silencioso e a algazarra matinal...